Depois
de passar por um finds de intensa diversão ao lado de boas gentes, a inusitada
e ressaqueada segunda-feira ainda guardava boas surpresas para esta pessoa que
aqui escreve. Cumprida as cruéis oito horas diárias (acrescidas de hora extra)
de um dia quase arrastado e sem muito ânimo, fiz a minha peregrinação quase que
rotineira de caminhar ouvindo algum som (Azymuth – Águia Não
Come Mosca) em destino ao Jarinão (prédio localizado bem no coração do centro
de Goiânia). Estabelecido no local citado, meu primeiro objetivo era comer
alguma coisa pra forrar o bucho e não deixar a saúde e o físico em situação
comprometedora. Quase matei uma espécie de PF que intitulam de jantinha lá no
Bar da Cida. Um sertanejo tocando numa televisão estendida por um suporte já
bem desgastado. Na rua, alguns meletas (aka moradores de rua) perambulavam pra
lá e pra cá atrás de algumas moedas pra aliviar a pressão em cima da pedrinha
preciosa. Cervejas desciam na mesa e eu não estava habilitado a beber naquela
dia. Tudo bem, aceitei a condição.
Terminada
a missão da larica desenfreada, a próxima meta era chegar na porta do Complexo,
lugar que estava recebendo uma das datas da No Hope Tour, que junta dentro de
uma Kombi as bandas Test e Deaf Kids pra uma gira por várias cidades neste mês
de março. Logo na porta encontrei com os caras das bandas, troquei uma ideia
rápida, dei mais um tempo ali na redondeza e adentrei ao espaço (que já é um dos
pontos da cena alternativa da cidade). Fazendo um breve reconhecimento do
terreno, topei com gentes conhecidas, figurinhas carimbadas do nosso
underground também faziam-se presentes, preenchendo bem o espaço. Sentei num pallet e fiquei matando um pouco do tempo enquanto os shows não começavam.
Entre
um gole numa água mineral, boas risadas de idiotices e superando o cansaço do
corpo, adentrei na salinha das apresentações pra prestigiar mais uma vez o
Frieza. E eu digo aqui mais uma vez: se ainda não viu este trio ternura em
ação, está perdendo a melhor banda da atualidade deste lado de cá. E nessa
ocasião não foi diferente, os caras estão com a navalha na alma e com um
entrosamento que causaria inveja no Kraftwerk. Com um bom público prestigiando
e entrando no mesmo mantra transmitido pela banda, em determinado momento
quando vi o Bruno Caveira entrando na salinha, juro que imaginei o homem
tirando uma cdj (cedêjota) do bolso e começando a discotecar alguma coisa
tropical com batidas descompassadas, já que se deixar o cabra discoteca até nas
plataformas do eixão. Brincadeira à parte, essa foi disparada a melhor
apresentação que vi da banda e conversando rápido com algumas pessoas, a
opinião era a mesma. Entrosamento absurdo, intensidade que impressiona e uma
entrega que faz valer cada real e esforço pra estar presente nisso que eu chamo
de troca de energia através do som sincero. Me impressionou muito, mais uma
vez.
Saí pra
tomar um arzinho, ver pessoas e apreciar as banquinhas de merchans. Muito
material atrativo pra pouco dinheiro, logo saí de perto pra não atiçar o meu
lado consumista. Sentei num canto e observei a boa movimentação de corpos pra
uma segunda de rolê inusitado. Num daqueles momentos “Tim Maia na fila do
banheiro”, teve gentes mandando um tequinho na carteira de trabalho, um deboche
elevado contra as falidas leis trabalhistas deste país. Momento de lazer e
descontração que cada um merece e faz da maneira que acha necessário. Passado isso,
alguém grita que estava pra começar o ritual do Test. Gosto bastante da banda e
fui ligeiro pra pegar um bom lugar na sala pra ver como estavam os cabras,
depois de um bom tempo sem presenciar uma apresentação da dupla. E foi diferente
de tudo que eu já tinha visto deles. Falar da incrível rapidez do Barata nas
baquetas já soa meio clichê, mas é sempre válido reforçar que o menino
impressiona, e muito. O João continua com a mesma pegada excêntrica e agressiva
de sempre, e a surpresa durante o ato foi a presença de uma percussão tribal
feita pelo batera do Deaf Kids. O transe sonoro se fez presente
naquele espaço e algumas entidades desceram e fizeram o seu pogo invisível.
Energia intensa, corpos e olhos hipnotizados. Saí de lá parecendo que tinham me
dado um banho de sal grosso, purificado. cansado e renovado.
Mas
ainda faltava o Deaf Kids, que era a atração mais esperada da noite, muito por
conta do lançamento de disco deles pelo selo do Neurosis e também por eles
estarem na grade de programação do Bananada. Vi algumas cabeças que comumente
não são vistas neste tipo de rolê, fato legal vale dizer. Falando da apresentação do trio, do começo
ao fim foi uma definição do indefinido. Reverbs, distorções, experimentos,
introspecção, tribal primitivo, introspecção e mais uma dose de noise muito bem
elaborado. O tribal rústico, algo que lembrou muito o Maracatu da zona da mata
entrelaça muito bem com toda a gama de estilos que a banda explora e insere em seus sons, feito pra descer de forma lenta e carregada de sensações/percepções. Chapei com toda a liturgia do canhoto que estava presentes nos acordes, nas batidas, nos ecos e em todo o ambiente completamente em transe profundo. Observei alguns corpos fora de seu plano, inclusive teve o baubau do Aneudes dando a sua aloprada clássica da metade pro final do rito. O saldo final disso tudo foi uma profunda catarse sonora e que me deixou com os sentimentos meio aflorados por bons minutos. Incrível.
Ao
final da boa jornada, eu estava meio zumbi/meio eufórico com o que eu tinha
visto, e eis que o João me intima no canto querendo uma palavra minha sobre a
banda prum documentário que eles estão gravando sobre esta turnê. Não deu
certo, pois eu estava ligeiro e dependendo de uma boa carona que salvou a minha
noite/madrugada, mas que deixo aqui os meus sinceros agradecimentos pela
consideração e lembrança pra participar de um registro importante da banda.
Outras oportunidades surgirão. E pra finalizar, depois de um tempo afastado das
atividades do underground clandestino, foi muito gratificante rever pessoas
daqui e amigos de outras cidades. Em plena segunda-feira ver o Complexo mais
cheio que num final de semana foi algo muito legal de presenciar e perceber que
Goiânia ainda é carente de eventos de qualidade com preços honestos. Minha única reclamação fica comigo mesmo, que entupiu o cu de cana no
final de semana e ontem mal conseguiu terminar uma latinha de Sprite. No mais,
muito obrigado aos envolvidos, a vida imunda conduzida de maneira inversa ao
proposto agradece sempre.
Obs.:
Saudade pra caralho de fazer resenha tosca.
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