31.12.13

Natal Na Zona, Molotov Sonoro & Confraternização do Fim do Mundo

Depois de passar por um natal sem nexo que festejou o nascimento do raparigo de nazaré numa chácara que já foi cabaré de beira de estrada e que por lá mataram um padre que gostava de amolegar as partes de coroinhas naquele recinto, voltei pra minha querida terra localizada no miolo do cu deste país.  Na semana em que coloquei os pés por aqui (Goiânia) chegara a notícia de que iria rolar a oitava edição do Thrash Core Fast, a festa mais tradicional da carniceria lado b do underground goiano. Claro, gostei tanto da notícia que quenguei o dedo mindim na quina do criado mudo, pura empolgação de porco ruim interessado em participar de mais um rolê imundo nos espaços clandestinos da cidade.

O sábado, dia marcado pra rolar o forró do gerso, começara com ameaças nebulosas de chuva ácida do lado sul da quebrada em que resido, nada mais que um susto ligeiro, já que a penumbra do sol da tarde ressurgira com toda a intensidade, castigando minha moleira e amolecendo minha seborréia.
Chegando ao local da farra do boi, logo fiquei de lero com alguns conhecidos do lado de fora, consumindo algumas ampolas, colocando as fofocas de cena em dia para inspirações resenhisticas posteriores, tudo isso entre uma acenada de filhos do césio (aka crackeiros) para a minha pessoa e criançada humilde perambulando com brinqueditos de baixa qualidade, provavelmente doados no natal da OVG. Adentrei no inferninho e logo na portaria me deparei com a dupla ilustre Julio & Rustoff, ganhei um exemplar do excelente zine Cidade Tóxica e bons papos sobre o honesto mundo do futebol midiático conduziam aquele início de fornalha vespertina na qual eu fazia questão de está
presente. Desci para o quintal da desgraça serena e pude ver uma boa aglomeração de corpos blasfêmicos, com muito olor de diambra no ar e chiados de gato no cio saindo do quartinho-quentura. Os ruídos anunciavam que a primeira banda estava abrindo os trabalhos do terreiro da vovó, era a Higiene Mental, mostrando o seu punk/hardcore dentro daqueles poucos metros quadrados, fazendo uma apresentação decente em que destacou os bons riffs da guitarrinha do Artur e o vocal gritado do cabra com visu de muriçoca-thrasher. Poucos minutos confinado naquele espaço que provavelmente já fora depósito de velharia, e a entrada de meu rego já estava toda suada. Boa apresentação que arrancou alguns sacolejos de minha ossada reumática.
Entre uma golada na cerveja quente (novidade) vendida no interior do estabelecimento de divertimento jovial comandado pelo doido do jipe Afonso Moreno e novos episódios envolvendo subcelebridades "libertárias" anônimas que serviam de chacota nos bolinhos de galera formados, o enredo ia tomando corpo e ritmo naquela tarde-quente-ternura no confortável Capim.
Entre a passagem de som, bizóiada rápida em materiais alternativos da two beers e com uma química
estomacal que me fez obrar naquele toalete higiênico do local, a Sociofobia, lenda do underground lado b desta cidade, subia no pequenino palco montado para soltar a sua artilharia densa e obscura de thrash metal old school.  Se existe alguma entidade maléfica do metal, Cláudio & Cia fizeram este maldito espírito manifestar-se naquele cubículo, calorzão comendo no couro e apresentação clássica, gostei mesmo do que vi, ainda mais com a nova formação que era desconhecida de minhas vistas cansadas.
Com a larica aflorando em meu ser, tratei de averiguar se no goxtoso ambiente havia algum rango para degustaçāo, e a triste constatação era de que não tinha nenhuma daquelas doidices saborosas veganas para venda. Mas chegou aos meus ouvidos que o cabra do bar estava fazendo umas coxinhas de galinha frita, o mesmo dizia que possuía curso de gastronomia, não quis me submeter aos experimentos do possível chefe e desconjuntar de vez o meu bucho naquela tarde/noite agradável.
Com muita expectativa de minha parte e bebendo muita cana, incrivelmente chegara a oportunidade de ver a Entre Os Dentes pela primeira vez em carne viva, pois sempre rolou alguma treta ou contratempo e nunca consegui presenciar o baile dos bonitos. Pois
bem, fiquei vendo a regulagem do som até o momento em que o quinteto transgressor começara a apresentação. Do começo ao fim do concerto fiquei muito abismado com a energia, presença de palco da banda, interação do público e a sonoridade linda que os joviais tiravam. A mescla de hardcore, thrashcore e passagens de rock psicodélico me hipnotizou de uma forma que há tempos eu não ficava nos shows. A performance do Victor (visu meio Phil Anselmo+Batera do Violator #rizos) é outro destaque, o cabra parece encarnar algum vocalista americano de hardcore oitentista, dando um toque mais que especial para o baile, conseguindo roubar toda a atençón do público para si. O urbano na batera é algo que todo ser com a consciência de Sun Rá deveria presenciar, pois o raparigo é cria boa das baquetas e pude ver isso de perto. As linhas de guitarras e solos são perfeitamente fodas e o baixo apaixonante presente na demo da banda, ao vivo é mais chocante ainda. Digo e repito, estes profanos da cantiga rápida estão com o melhor show underground da cidade, e quem falar o contrário ou deve gostar de Kamura ou possui antipatia com o The Exploited (#rizos #rizos #rizos). Saí do quartinho-ternura completamente ensopado e extasiado com um dos melhores shows que vi neste 2013 por essas bandas de cá.
Passada a euforia de abilolado e voltando para os excessos da bebida, chegara aos meus
sebosos ouvidos o boato de uma possível surpresa naquele sábado fraterno. Era a volta aos palcos do coqueluche da podreragem goiana, a Tirei Zero apresentando a nova formação, agora com o Victor assumindo as cordas finas, antes ocupada pelo mestre André Alemão. O concerto foi rápido e não menos intenso, com o Pedrim Voador parecendo ter ossos de andorinha com seus incríveis pulos, deixando hematomas em alguns bons raparigos presentes nas rodas. Júlio, um dos tortos da família Baron, como sempre há de ser, com o seu visual de indie-ao-contrário, pode-se dizer que deu um workshop de linhas de bateria para xs derrotistas presentes. Brunete com o seu instrumento de cordas grossas aperfeiçoando cada vez mais as dobradiças de seus sofridos joelhos e o novato Victor, bem prendado que é, dando um gás universitário-vagabundo pra banda. Foi muito bom ver que os cabras estão com as energias renovadas e prometendo novidades para o próximo ano.
Fui dar um descanso pra minha espinhela e pegar um ar do lado fora, no novo espaço lounge da casa, e presenciei a linda cena de três pais da cirrose dançando em ciranda com uma granadinha de 51 no meio, como se fosse uma linda oferenda a ser abençoada. Fiquei com inveja daquela felicidade / celebração sincera e espontânea, adentrei novamente ao nobre recinto, pois o grand finale estava por vir em grande estilo
decadente, com a volta do conjunto de cantiga ligeira WxCxMx, um dos grandes orgulhos da cena local dos anos 2000, que estava num hiato semelhante ao dos Los Hermanos. Bicho, os cabras ficaram mais anciãos e melhoraram na descujuntura apresentativa, pois o quarteto formado por Slake, Alexandre, Gabriel Stone e Júlio passaram a impressão de que estavam com ódio e raiva acumulada. Diversão, amizade e protesto em formato de caos, aonde pirei muito na presença e energia do baixista Stone (mescla facial de Porcão+Léo Bigode), o cabra surra seu instrumento como uma mãe que sapeca os couro de suas crias com vara de marmelo. O resto do clã eu já conhecia de longa data, pelos inúmeros bailes vistos, e falo aqui, os bacharéis estão tinindo como nunca tiveram. Apresentação épica, cover de Ratos de Porón & Olho Seco, com direito ao Slake esgoelando todo pendurado na janelinha e encerrando aquele lindo sábado de confraternização contracultural de forma brilhante. Quem não foi perdeu mais uma edição do evento mais legal da cidade, sem verba de governo e sem a maracutaia das leis de incentivo, tudo feito na base da amizade, do faça-você-mesmx, sempre na intenção de preservar e manter a chama acesa do punk / hardcore, da diversão sem compromisso com o policiamento tosco e do espírito de fazer aquilo que gosta, aliviando momentaneamente todo o veneno que o sistema e o cotidiano nos causa. Que festa boa, terminei a noite comendo um x-podrão e vendo o cambito do Anderson ficar pôdi igual o joelho do ronaldo.



Fotos por: Alex Almeida Katira

*Parte desta resenha foi escrita ao som do magnífico vinil "A Tábua de Esmeralda", obra do grande mestre Jorge Ben.

*Agradeço de coração aos responsáveis pelo evento, pelos discos que o Israel me presenteou, ao Markin pela carona e bons papos, pelas boas amizades que reencontrei e pela linda mulher que atura as minhas doidices sinceras. Paz e bem para aqueles que querem, aos que não, o nada é infinito.

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